Meus
Amigos,
Não sei se
isto se passou em tempo de crise ou não, mas de acordo com o que vos conto,
podereis fazer o vosso julgamento.
Éramos seis
pessoas na nossa casa: o meu marido e eu, as nossas três filhas e a
empregada.
Nós
trabalhávamos os dois fora e as meninas estavam a estudar.
A gestão dos
nossos proventos era feita de uma forma muito simples, utilizando o que nós
chamávamos o método dos envelopes, o qual vos passo a descrever.
O meu marido e
eu, nos dias 30 de cada mês, sentávamo-nos à secretária do escritório para fazer
a distribuição por envelopes da quantia que tínhamos recebido no emprego, de
acordo com a previsão das despesas mensais. Este sistema foi usado durante
vários anos com ótimos resultados. Partíamos do princípio de que, uma vez
despendida a quantia dum envelope naquilo para que estava reservada,
não podíamos retirar dinheiro de
outro qualquer dos envelopes cujo conteúdo se destinava a cumprir outra
despesa.
Em primeiro
lugar juntávamos o dinheiro dos nossos vencimentos, tomando o meu marido nota na
agenda do total recebido. A seguir fazia-se a distribuição pelos envelopes, na
parte da frente dos quais escrevíamos, além da quantia inclusa, o fim a que se
destinava; a seguir fechavam-se os envelopes, e o meu marido voltava a registar
na sua agenda como fora feita a distribuição: para os "gastos da casa" -x, para
mim-y......Eu, ao juntar o meu ordenado ao do meu marido, sentia-me a contribuir
igualmente para as despesas da casa e, sempre mais à vontade para fazer qualquer
compra que considerasse necessária. Mas este envelope com o meu nome e o registo
do dinheiro que continha era para os meus gastos pessoais. Não podem calcular as
manobras que fazia com ele! Daí saíam presentes, roupas para mim e para as
minhas filhas e uma diversidade de pequenas coisas que, nem sempre sendo
essenciais, amenizavam o meu dia a dia.
E continuava o
registo dos envelopes: "gasolina", "quotas da associação", "médicos e remédios",
"despesas escolares", "prestações" ( se as havia ) "impostos" e "diversos".
Quando sobrava algum dinheiro metia-se num envelope e escrevia-se "banco" e o
meu marido dizia que aquele era para guardar.
Nos dias 1 do
mês seguinte começávamos imediatamente a fazer os pagamentos com o dinheiro do
envelope respetivo. O dos "gastos da casa" estava reservado aos pagamentos da
empregada, do condomínio, da eletricidade, do gás, da água, compras na
mercearia, no talho, etc., etc..
Mas, se na
maioria dos meses, eu governava a casa com a verba que o meu marido me dava, sem
problema de maior - não me considero excecional em gestão, mas procuro fazer o
possível - contudo havia dois meses do ano em que me sentia muito embaraçada
desde o início do mês, porque sabia que o dinheiro me iria faltar; eram os meses
de Outubro e de Dezembro.
As minhas
filhas fazem anos em Outubro, a mais velha e a mais nova no dia 15 e a do meio
no dia 29. Acontecia-me que nunca conseguia festejar igualmente aqueles dois
dias, por falta de verba.
Por outro lado
era o mês do início das aulas e também do outono; era necessário comprar os
livros de estudo e apetrechos escolares e roupa de inverno para as nossas filhas
que ainda estavam em idade de crescimento. Às vezes, ainda havia possibilidade
de a mais nova usar algum casaco ou gabardine de uma das irmãs, mas ainda assim
era difícil. Aproveitei muitas vezes dar-lhes roupa como presente de
aniversário. E quanto às suas festas, durante vários anos comemorávamos os
aniversários das três garotas no dia 15 com uma festa para toda a família e
amigos. Procurávamos compensar com alegria, gentileza e grande amizade o
embaraço dos convidados, ao terem de se apresentar com três
presentes.
Como podem
calcular, no dia seguinte, 16 de Outubro, quando tentava fazer as contas,
concluía inevitavelmente que tinha gasto mais do que tinha previsto. Daí em
diante começava o recurso a pastéis e a empadões com recheio de carne, frango ou
peixe,e, algumas vezes, ao envelope com o meu nome - era a exceção para
confirmar a regra! Como me costumavam pagar no dia 26, pensava que a aflição
duraria dez dias e, passado esse período, poderia retirar algum dinheiro que
seria descontado da mesada de Novembro.
No dia 29 de
Outubro, aniversário da minha filha do meio, que já tinha tido a sua festinha
com a das suas irmãs no dia 15 anterior, levava as três com algumas amiguinhas
ao cinema ou ao Jardim Zoológico ou a qualquer outra diversão, procurando não
agravar demasiado o desequilíbrio já atingido.
Em Dezembro o
problema era mais fácil, porque os dois recebíamos o 13º mês. Mas quantos
desejos para realizar! A bicicleta, a máquina de escrever e a máquina de
calcular para as filhas! O toca-discos para o marido! E, eu própria, havia meses
que sonhava em completar a decoração do nosso "living" com um móvel de módulos!
E a ceia de Natal com a família em que cada um recebia um presente!
Mas não só a
existência de dinheiro e de perícia na arte de governar a casa são suficientes
num lar para resolver todos os seus problemas monetários! São também
necessárias, a boa vontade e a compreensão da parte de cada um dos componentes
da família - e realmente essas nunca me faltaram. E mais, próximo das férias
grandes, tínhamos a possibilidade de fazer uma viagem surpresa, o que sempre
dava muita satisfação a toda a família.
Este
método dos envelopes, assim descrito, mereceu um prémio de uma empresa
internacional de cosméticos no ano de 1975, no Estado do Rio, Brasil.
Maria da Fonseca
Olá, Maria da Fonseca!
ResponderEliminarIsso quase que era "contabilidade industrial", aplicada ao governo da casa.(estou a brincar...)
Os tempos mudaram, e muitos confundiram o dinheiro do banco pronto a emprestar como seu, e deu no que deu...
"Consumir é preciso", tornou-se o lema para muitos, mesmo para aqueles que não o podiam fazer.A pressão para gastar é imensa,e não é nada fácil resistir aos que nunca ganharam hábitos de poupar.Infelizmente...
Belo texto, lição a aproveitar para aqueles que ainda possam ir a tempo.
Bom resto de semana; abraço amigo.
Vitor
Muito bem escrito o texto e excelentemente descrito o "método dos envelopes". É engraçado, quando víamos os envelopes, muito certinhos, na gaveta, e recebíamos a mensagem de que precisávamos de poupar, tudo nos parecia natural e aceitável, como se os envelopes se tivessem organizado espontânea e autonomamente e nós tivéssemos simplesmente que cumprir as suas orientações :)... A verdade é que nunca nos faltou amor e carinho, e podemos agradecer aos nossos queridos pais por uma infância muito feliz. Beijos, Ilona
ResponderEliminarMinha amiga, li comovidamente este seu texto. o "método dos
ResponderEliminarenvelopes" eu usei também durante muitos anos após o meu
casamento mas a determinada altura começámos a receber os
vencimentos pelo Banco, a existir os cartões do multibanco
e tudo se alterou.Mas era exactamente como a amiga diz
que eu fazia.
Um grande beijinho
Irene Alves