sábado, 24 de maio de 2014

Rosas

                                                                               
 
 
Eu quero cantar as rosas
Por tão lindas elas serem.
Brancas, rosa ou vermelhas,
Belas cores me of'recerem.
 

Onde estão, elas encantam,
Quer no quintal da vizinha,
Na sebe da viscondessa,
Ou na antiga capelinha.
 

Também há quem as coloque
Nas campas dos mais queridos,
Porque eram as preferidas,
Em vários tons coloridos.
 

 
Têm espinhos, eu sei,
Mas não s'rá essa a razão
Pra deixar de as admirar,
Gratas ao meu coração.
 
 
Reverso tem a moeda,
O gelo pode queimar.
Não há amor sem ciúme
E até o doce, amargar.
 
 
Rosas não há sem espinhos,
Mas, de pétalas macias
Agradecem ao bom Deus
A vida, todos os dias.
 
Maria da Fonseca

sábado, 3 de maio de 2014

Minha Mãe, Minha Mãe! Poema de Guerra Junqueiro

 
 
Minha mãe, minha mãe! ai que saudade imensa,
Do tempo em que ajoelhava, orando, ao pé de ti.
Caía mansa a noite; e andorinhas aos pares
Cruzavam-se voando em torno dos seus lares,
Suspensos do beiral da casa onde eu nasci.
Era a hora em que já sobre o feno das eiras
Dormia quieto e manso o impávido lebréu.
Vinham-nos da montanha as canções das ceifeiras,
E a Lua branca, além, por entre as oliveiras,
Como a alma dum justo, ia em triunfo ao Céu!...
E, mãos postas, ao pé do altar do teu regaço,
Vendo a Lua subir, muda, alumiando o espaço,
Eu balbuciava a minha infantil oração,
Pedindo ao Deus que está no azul do firmamento
Que mandasse um alívio a cada sofrimento,
Que mandasse uma estrela a cada escuridão.
Por todos eu orava e por todos pedia.
Pelos mortos no horror da terra negra e fria,
Por todas as paixões e por todas as mágoas...
Pelos míseros que entre os uivos das procelas
Vão em noite sem Lua e num barco sem velas
Errantes através do turbilhão das águas.
O meu coração puro, imaculado e santo
Ia ao trono de Deus pedir, como inda vai,
Para toda a nudez um pano do seu manto,
Para toda a miséria o orvalho do seu pranto
E para todo o crime o seu perdão de Pai!...

(...)

A minha mãe faltou-me era eu pequenino,
Mas da sua piedade o fulgor diamantino
Ficou sempre abençoando a minha vida inteira,
Como junto dum leão um sorriso divino,
Como sobre uma forca um ramo de oliveira!
 
Guerra Junqueiro
(1850 - 1923)